Posições de Desejo

Artista Precarizado e Posições de Desejo Porto Alegre, 20 de junho de 2022. #blogpost [english below]

A formação de artistas em instituições públicas, para todas as classes sociais, é considerada fundamental, embora persista um imaginário que beira o aristocrático para seu acesso e atuação. Conversando com colegas da área, de diferentes regiões do Brasil, falamos sobre a insuficiência de discussões dirigidas e de políticas que possam garantir o exercício digno de trabalhadores artistas, com ou sem formação acadêmica.

Viver com o trabalho da arte ainda parece ser um capricho de poucos favorecidos economicamente. Na medida em que camadas populares começaram a ocupar efetivamente cadeiras do ensino das artes, disparidades sociais são cada vez mais destacadas. Quem conseguiu e quem consegue se manter com arte? Por muitas vezes, somos conduzidos a uma teorização negativa da arte e até mesmo da figura do artista como um problema conceitual do Ocidente, como se não praticássemos mais termos problemáticos no cotidiano - vide exploração capital, concentração de renda, indústria insustentável, dentre outros tantos conceitos. Se arte é tão questionável nos dias de hoje, resta-nos sua atividade envolvida de cinismo?

Quanto mais precarizado é o lugar desde onde se enuncia, afirmar-se como artista é uma posição de desejo, de uma positividade ferrenha, considerando a parede de incertezas diante da vontade. Exige outro modo de se relacionar com esse conceito, distante de qualquer excentricidade ou tédio de abastados. Encontramos no vocábulo da arte a oportunidade de uma vitalidade criativa inadiável, sem pretensão de salvá-lo ou de destruí-lo. Tomamos a palavra apenas como vazão para um tipo de ofício descabido à ordem dos dias, pois respiramos dessa maneira - chame-o como quiser, desde que sua prática aconteça.

O despertar de outra compreensão da arte, enquanto fazer vital diferente do estreito cinismo contemporâneo, pode nos levar a outros arranjos sociais, outros espaços de visibilidade, outras dinâmicas de renda, de produzir acesso, de se exigir direitos – por que não? – trabalhistas. Quão intoxicado está nosso imaginário para deixarmos o descaso de hoje ditar os modos de existência?

-- Escrito por Elias Maroso.

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[english version]

Precarized Artist and Desire Positions
Porto Alegre, June 20, 2022.

The artist formation in public institutions, for all social classes, is considered fundamental, although an imaginary that borders on the aristocratic persists for its access and performance. Talking to field colleagues, from different regions of Brazil, we talked about the insufficiency of policies that guarantee the dignified exercise of artist workers, with or without academic graduation.

Living with the work of art still seems to be a whim of the economically favored few. As popular layers began to effectively occupy chairs in public art schools, social disparities are increasingly highlighted. Who got it, and who can keep up with art? Many times, we are led to a negative theorization of art and even the figure of the artist as a conceptual problem of the West, as if we do not practice other problematic terms in everyday life - see capital exploitation, income concentration, and unsustainable industry, among others, so many concepts. If art is so questionable these days, is its activity involved in cynicism left to us?

The more precarized is the place from which it is enunciated, asserting oneself as an artist is a position of desire, of a fierce positivity, considering the wall of uncertainties in front of the will. It requires another way of relating to this concept, far from aristocratic eccentricity or boredom. We find in the word of art the opportunity for an unavoidable creative vitality, without any pretense of saving or destroying it. We take the word only as an outlet for a kind of craft that is out of place in the order of the day because we breathe that way - call it what you want, as long as its practice takes place.

The awakening of another understanding of art, while making vital different from the narrow contemporary cynicism, can lead us to other social arrangements, other spaces of visibility, other dynamics of income, producing access, and demanding rights – why not? – labor. How intoxicated is our imagination to let the neglect of today dictate the modes of existence?

-- Written by Elias Maroso.